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HQ Rafaga em exposição na 11ª FEIRA HQ, em Teresina. |
2010 foi um puta ano,
como eu já pude dizer num post anterior.
2011 começa sem que eu prometa nada, mas já me prometendo um bocado de coisas. Para o primeiro semestre são duas coletâneas com trabalhos meus. A primeira chama-se
Histórias Fantásticas, onde tive um conto selecionado para o volume 3. O livro é organizado pela escritora
Georgette Silen e será lançado pela
Editora Cidadela. O conto se chama
PRR: Resultado de um inquérito e é uma fantasia bem brasileira. No final do post vai um trechinho. A outra coletânea, já anunciada no blog, é a
Quadrinhos em História, da
Editora Multifoco, onde participo com uma história em quadrinhos em parceria com
André Pinheiro, desenhista de Limoeiro do Norte. É uma história sobre a vida na favela. Engraçado que escrevi esse texto antes da invasão do Complexo do Alemão, mas a história acaba tendo muito a ver com esse episódio. Essa HQ, junto com
Rafaga - Prólogo, foi também selecionada para exposição na
11ª Feira HQ, que aconteceu um outubro de 2010, em Teresina, Piauí, fato que eu ainda não tinha comentado no blog.
Várias outras coisas estão em produção, entre elas parcerias em quadrinhos com
Rob Lean,
Douglas Dias e
Wagner Nogueira, além de um romance. Este último é minha primeira tentativa de um texto longo de ficção, uma idéia que comecei a esboçar no ano de 2007 e que retomo agora com a meta de terminar até o final deste ano. Quem sabe 2012 não começa com uma notícia do meu primeiro livro?
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Capa da antologia Histórias Fantásticas - volume 3. |
Trecho do conto: PRR: Resultado de um inquérito, de Zé Wellington.
Impressionado, Daniel Villa-Lobos cruzava aqueles quilômetros de floresta. Em meio à selva de pedra em que havia se transformado a Amazônia, aquele território havia se tornado o único ponto verde na foto via satélite. Mas eu não vim aqui pra contar árvores. Enquanto avançava pela estrada, Daniel lembrava como Ari tinha um jeito estranho, o tipo de cara que raramente sorria, deixando em dúvida se a piada tinha sido ruim ou se ele não tinha entendido. Daniel atravessava o jardim de imensas árvores e flores tropicais que recepcionava os visitantes da PRR Indústrias, uma das maiores empresas do país.
De súbito, o brilho dos vidros que recobriam o prédio da PRR interrompeu o verde natural: um colosso de pelo menos cem andares enraizado na mata fechada. Daniel adentrou o edifício encontrando um saguão vazio com um elevador que o convidava a deixar aquele ambiente silencioso. Antes que pudesse clicar no botão que ordenava a máquina a buscá-lo no andar térreo, a porta já se abria. Do seu interior surgiu um irritado senhor de menos de um metro de altura.
– Não sei como consegue, ele sempre me passa a perna! Sua única perna! – praguejava o pequeno ser enquanto cruzava o saguão. Por um instante Daniel pareceu notar uma estranha peculiaridade: os pés do anão eram virados para trás. Sua mente não conseguiu deixar de imaginar algum filme jodorowskiano.
Em alguns instantes Daniel chegava à cobertura do edifício, que abrigava um grande salão. À sua frente uma bela moça cantarolava baixo uma canção, enquanto digitava freneticamente em seu notebook.
– Tenho uma reunião com o seu Isac Lobato. – disse para a secretaria, que demorou um pouco até perceber a presença do rapaz e parar de cantar.
– Claro, seu Daniel! – assustou-se, tirando pequenos fones do ouvido – Ele já o aguarda. – respondeu com uma voz aveludada, que quase acariciava o cérebro do rapaz.
O contato com a moça o lembrou de Ari, que tinha um jeito estranho de olhar os outros, nunca encarando alguém por mais de dez segundos.
Uma grande porta separava Daniel do empresário Isac Lobato. Ao cruzá-la o jovem Villa-Lobos deparou-se com um belo escritório com móveis em madeira. Um vitral, com pelo menos cinco metros de altura e vista para a floresta particular da PRR, se erguia ao fundo completando o cenário. Um homem de cabelos grisalhos olhava por ele compenetradamente.
– A que devo o prazer de recebê-lo aqui, Sr. Villa-Lobos? – atirou Isac Lobato, em um tom ríspido, temperado com uma pitada de ironia.
– Acho que o senhor sabe muito bem o que vim fazer aqui, seu Isac. – salpicou Daniel.
– Por que não refresca a minha memória, Daniel... Acho que depois de tantas visitas já posso chamá-lo de Daniel, certo? – a ironia já parecia ser o ingrediente principal das palavras do empresário.
O jovem aproximou-se de Isac e lançou uma pasta sobre a mesa. As fotos que ali estavam saíram quase como ensaiadas, uma sobre a outra, criando um macabro baralho de imagens que tinham como personagem central um homem morto em um matagal. Viam-se grandes marcas no pescoço do cadáver. A cabeça estava ao lado do corpo, completamente dilacerada e coberta por uma gosma que lembrava uma mistura de saliva e sangue. Ari estava irreconhecível. Naquele momento Daniel lembrava como o amigo reagia ao toque das pessoas, como se recebesse uma descarga elétrica.
(Continua no livro Histórias Fantásticas - Volume 3)