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16 de out. de 2017

É assim que (se re)começa (Lista do Zé #14)


Olá, olá!

Eu voltei... Agora pra ficar... Por que aqui-- Ah, pára vai. Foram meses malucos, numa volta de 180º na minha vida. Entre mortos e feridos, sobrevivi. Mas o que importa é que aos poucos vamos devolver a atividade pra essa bodega.

Além das mudanças no campo pessoal e profissional, tem dois álbuns novos aí querendo nascer e logo eu vou falar deles (no próximo texto, acho). Mas essas histórias... Como nascem? Onde vivem? Do que se alimentam? Eu resolvi escrever sobre (um dos caminhos mais comuns no) meu processo produtivo. Quer começar uma história, mas não sabe por onde começar? Deixa eu te contar como eu faço. Pode te ajudar. Ou não.

Ah, só para reforçar: receba estes textos no conforto do seu e-mail preenchendo seus dados no final da postagem.

Processo "caótico" 

Existem várias formas de se estruturar uma história. Mckee, Field, Vogler... Pode escolher o teórico de sua preferência. Tem para todos os gostos: 3, 5, 10, 1000 atos. Tem um monte de gente tentando encontrar uma fórmula ou receita para a história (filme, livro, HQ, publicidade etc) comercial perfeita. Eu não gosto de fórmulas, mas entendê-las é bem esclarecedor (e te ajuda dá segurança para seguir sem elas).

Construir uma história não é fácil. Depois de treze anos escrevendo, agora que estou encontrando a minha forma de fazer isso. É uma mistura do que muitos autores ensinam, mas não se parece com nenhum. Ainda assim, os últimos dois quadrinhos que lancei tiveram processos muitos diferentes entre si e ainda mais diferentes dos dois próximos quadrinhos que irei lançar. Quando você pergunta para um autor como é o processo dele é comum ouvir ele dizer "que é caótico". É um clichê e é delicioso confundir as pessoas com essa expressão, mas, pelo menos no meu caso, é a mais pura verdade.

Às vezes vem de uma situação que eu passei ou vi. Às vezes surge enquanto eu vejo um filme ou leio uma história em quadrinhos. Às vezes começa com uma pergunta. Às vezes com um diálogo entre duas pessoas. Às vezes com uma ideia que eu quero defender. Simplesmente surge o insight e eu começo a escrever ao redor dele, loucamente, qualquer ideia relacionada. Além disso, corro para minha estante de coisas não lidas e vejo tudo que possa contribuir com aquela ideia. Vejo filmes na Netflix, converso com outras pessoas a respeito... É hora de imergir no mundo daquela história para conseguir o máximo de informações. E juntar essas informações em algum lugar. Hoje eu junto num documento do Google Drive.

Aí entra um adendo importante: nenhuma história minha é feita nas condições que eu gostaria (como a maioria das pessoas pensa que acontece). Leia-se por condições ideais sentar-se numa mesa durante uma semana, oito horas por dia, para pensar no que vou contar e, realmente, começar a fazer. Com a) trabalho (muito trabalho) e b) crianças (muito mais trabalho), é comum eu me dedicar intensamente a uma história durante alguns dias e deixá-la guardada por meses até ter tempo para voltar nela novamente. E eu esbarrei com a charge do Odyr que inicia este texto nesses dias e descobri que isso não acontece só comigo.

Depois de deixar uma ideia incompleta numa gaveta e passar semanas sem conseguir escrever por motivos do tipo a ou b, o processo de retorno a esta ideia é lento e envolve reler e lembrar muitas coisas, num catatau de letras entre referências de outras obras e coisas que eu mesmo escrevi. Por essas e outras, em Sobre a Escrita (que eu já falei a respeito aqui), Stephen King recomenda que nunca se leia o que se escreveu ontem ou antes de ontem. Sempre em frente, diz o rei, e quando chegar ao final da sua primeira versão você pode (e deve) voltar ao início e revisar tudo. O método é tentador (e provavelmente muito eficaz), mas as milhares de releituras me permitem lapidar a história e minimizar erros, mesmo que produtivamente essa não seja a melhor forma por que demanda MUITO MAIS TEMPO. Funciona para mim? Sim. Mas entre um método meu e outro do Stephen King, a escolha parece meio óbvia, né?

O próximo passo é processar o que juntei, transformando o calhamaço de informações em uma sinopse, tipo aquelas atrás das antigas fitas de videocassete. É um resumo sem entregar muito da história, que convença alguém (neste momento eu mesmo) que aquilo vale à pena. Nas fitas VHS ou nas contracapas dos livros, o final não está lá para não estragar as surpresas da história. Nesse meu caso, o final não está lá por que eu ainda não sei como vai acabar mesmo. Penso essa sinopse de forma publicitária, para saber a força dessa ideia. É provável que ela mude completamente quando o livro for lançado, pelo tanto de voltas que a história dá até que ela realmente fique pronta. Mas naquele momento inicial ela cumpre um papel de me mostrar um vislumbre de como seria aquilo pronto e me convencer de que aquilo merece ser contado (e o tempo, investido).

A sinopse é uma parada muito legal de se fazer. Não sei se é por que trabalho com publicidade, mas adoro pensar em como eu venderei o produto final. Já a etapa seguinte, o argumento, é uma BARRA. Nele preciso descrever com mais detalhes a história, incluindo início, meio e fim. E aí sou confrontado com uma das perguntas mais difíceis de responder para quem escreve histórias: como vai acabar? Pra mim é uma das partes mais complicadas de se fazer. Sou muito exigente comigo mesmo com relação a isso e inclusive sou ciente que errei bastante nesse ponto em trabalhos anteriores. Eu gosto de finais conclusivos, mas que deixam possibilidades abertas, por mais contraditório que isso possa parecer. Vale dizer que É IMPORTANTE SABER COMO A HISTÓRIA VAI TERMINAR ANTES DE SEGUIR PARA AS PRÓXIMAS ETAPAS. Está em caixa alta, por que é um erro comum não seguir este conselho.

Vencido o argumento (e o final), aí vem ele, a estrela da coisa: o roteiro. O roteiro nada mais é do que uma descrição quadro a quadro do que acontece na HQ. Muita gente não entende o que é isso. É comum acharem que um roteiro de HQ também é desenhado (e até pode ser em alguns casos), então eu vou falar de novo de outro jeito: o roteirista descreve, normalmente em forma de PALAVRAS, o que acontece em cada quadro da HQ. O resultado deste processo é um documento longo. Para se ter uma ideia, o roteiro de Quem Matou João Ninguém? tem quase 25.000 palavras, o que equivaleria a metade do tamanho médio de um romance.

Informações soltas, sinopse, argumento... O roteiro usa tudo isso como base, mas sem nenhuma paixão por manter as coisas do jeito como estão. Digo isso por que é comum surgirem ótimas ideias no processo que podem te fazer mudar a história como um todo. Em dos meus roteiros atuais eu tinha muito claro o meu grupo de personagens principais, incluindo um personagem específico, que entrou na história por que eu tinha um ótimo final para ele. Mas quanto mais eu escrevia, mais ele sobrava naquele meio. Até que eu decidi que não fazia sentido ele estar ali. E ploft: já era. Perdi uma baita sacada no final (que vai acabar ficando para outra história), mas ganhei mais espaço para desenvolver os outros personagens.

Depois do roteiro, a história vai para o desenhista (ou ser filmada no caso de um filme). Mais etapas vem pela frente, como desenho, cores, artefinal, letreiramento e editoração... Num grande mercado meu trabalho como roteirista acabaria aqui, no roteiro em si... Mas estamos falando do Brasil e, normalmente, sobra para o roteirista gerir a equipe que faz o trabalho. Mas esse é um assunto para outro texto.

Tem muito mais coisas para escrever sobre criar uma história e eu quero contar mais sobre elas no próximos textos. Mas esse texto ficou longo e eu pensei que parar por aqui aqui ia te deixar muito curioso. Ou seja, um bom final.

Charlie Kaufman está julgando você, que não está escrevendo agora.

Bem rapidinho


  • Em Ritmo de Fuga (Baby Driver) é espetacular, né? O mundo vai descobrindo o diretor Edgar Wright, mas você, que é esperto e lê a Lista do Zé, já tinha descoberto no texto #8.
  • Já viram a terceira temporada de Rick and Morty?
  • Novos CDs do Foo Fighters e do Queens of Stone Age rolando. Já escutaram?
  • E no mês de novembro rola o NaNoWriMo, desafio para escritores que consta em escrever um livro do início ao fim durante o mês de novembro. A proposta é chegar as 50.000 palavras em 30 dias. Se nos próximos treze dias eu matar os dois roteiros que estou fazendo, penso em encarar o desafio e finalmente finalizar meu primeiro romance em prosa. E aí me veio uma maluquice de montar um grupo de apoio com outros autores que vão participar. Não vai ser nenhum tipo de consultoria e nem vamos ficar mandando os textos uns para os outros (se fôssemos ler o que cada um escreve nem teríamos tempo para escrever), mas ter um espaço onde pudéssemos compartilhar nossas experiências e incentivar uns aos outros para chegar no final (como um grupo de corrida nerd). Se estiver afim de participar, manda e-mail para contato (@) zewellington.com.
E como diria King, sempre em frente.

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30 de jan. de 2017

E o tal do edital? (Lista do Zé #12)



Olá, olá!

12º texto... Um ano de textos na Lista do Zé! E chegando hoje, no chamado Dia do Quadrinho Nacional. Aos que gostaram do texto sobre Economia Criativa, dessa vez vamos falar sobre como financiar o seu trabalho artístico através dos editais de incentivo.

(Ah, vale lembrar que esses textos podem ser enviados diretamente para seu e-mail, é só se cadastrar no final desta postagem)

(a tira que ilustra este post é do Carlos Ruas)

E o tal do edital?

Meus dois primeiros quadrinhos longos foram lançados com recursos de editais de incentivo. Para quem não sabe esses editais são uma espécie de seleção de projetos para serem apoiados por uma instituição pública (bancos, prefeituras ou governos estadual e federal) ou privada (empresas como Oi, Coca-Cola e muitas outras). Essas instituições têm recursos para investir em projetos culturais. O que elas ganham com isso? Bom, as instituições públicas normalmente fazem isso por que é papel delas dar este apoio e tem orçamentos próprios para isso (e não dá para apoiar qualquer um que bata na porta de uma secretaria ou ministério da cultura). Já as privadas usam esta seleção como uma forma de selecionar projetos que irão patrocinar, recebendo em troca a divulgação da marca da empresa no material promocional do projeto apoiado.

Vou para meu quarto projeto financiado por edital. Às vezes fico até meio envergonhado de falar isso, mas a verdade é que sem esse tipo de apoio eu provavelmente não conseguiria fazer quadrinhos. A esta altura do campeonato você já sabe que eu sou roteirista e que preciso de desenhistas para os meus álbuns, pessoas que posso pagar através destes editais. O que talvez você não saiba é que sem estes recursos quem trabalha comigo teria de esperar o álbum ser lançado, normalmente entre seis meses e um ano depois que o trabalho começa, para começar a ganhar alguma coisa, especificamente quando ele começar a ser vendido (e eu nem vou falar aqui do quanto se ganha com as vendas, mas saiba que é bem pouquinho para quem está começando). E como é que alguém trabalha durante um ano numa coisa sem ganhar nada por ela nesse período? Bom, bem-vindo ao mercado nacional de quadrinhos, este lugar de pessoas apaixonadas e um tanto malucas.

Então o fato é que tenho participado de todo edital que posso desde 2010. Se hoje é bonito falar que ganhei quatro paradas dessas, preciso dizer antes que passei três anos apenas PERDENDO. E mesmo o primeiro edital que ganhei, que possibilitou Quem Matou João Ninguém?, acho que só cheguei lá por que concorri 1) numa categoria de quadrinhos e 2) apenas com projetos do interior do Ceará. Arrisco a dizer que talvez só o meu projeto e o outro vencedor tenham se inscrito na época... Mas meu caso é uma exceção: na maioria das vezes esse tipo de edital é bem concorrido. Algumas áreas da cultura brasileira são extremamente dependentes de editais, como o audiovisual (por conta dos altos custos para ser realizado). Isso faz com que uma seleção nesta área seja um verdadeiro campo de batalha de projetos. Então, o que se pode fazer para ter um pouquinho mais de chance de se acessar esse tipo de recurso?

Primeiramente ter um bom projeto e um currículo interessante, para provar que irá conseguir realizá-lo. É por isso que os editais não são para quem está dando os primeiros passos. Em 2013, quando ganhei meu primeiro edital, eu já tinha nove anos de produção de quadrinhos. Eram fanzines e eventos pequenos, mas coisas que davam CREDIBILIDADE para mim e para o meu projeto. E nem preciso falar da importância dessa experiência para ter uma proposta razoável e que convencesse os avaliadores do edital de que o resultado prestaria, né?

É bom ter em mente também que você vai começar uma relação em que você será extremamente cobrado por quem vai lhe financiar. Por isso já na inscrição rola o primeiro filtro: o da paciência. Os processos seletivos exigem uma série de documentos e é preciso persistência e organização para juntar tudo. Mais do que isso, quem quer pleitear um recurso assim precisa da tal paciência para LER o edital. Parece bobagem, mas a maior parte do segredo de ganhar algo assim está em ler e entender o que é pedido. Muita gente reclama de tanta burocracia, tanto documento, tanta certidão e tanto esclarecimento. Mas veja bem: é dinheiro público sendo "dado" para alguém num país onde a corrupção... Bom, você já sabe. Muitos projetos apoiados em editais não são concluídos nunca. Às vezes por inexperiência ou outros problemas pessoas do artista/realizador (o que valeria até um novo texto). Mas muitas vezes por safadeza mesmo.

Para navegar neste mar de exigências, eu sempre digo para todo mundo que outro fator chave para conseguir ganhar meu primeiro edital foi conversar com pessoas que já tinham ganhado este mesmo edital antes. Eu acho que essa é a dica de ouro para ajudar no entendimento dos pontos mais esquisitos do linguajar burocrata de um edital.

Mas a burocracia é importante para ensinar uma primeira regra para quem quer ser financiado pelo governo: vai piorar se você ganhar. Depois de selecionado, para receber a grana tem mais um pouquinho de burocracia: envio de certidões, abertura de conta bancária, assinatura de convênio... E quando o dinheiro vem, vem também a necessidade de se cumprir as exigências da instituição sobre como vão ocorrer os pagamentos e as prestações de conta. Algumas vezes você recebe a grana numa conta que tem que gerenciar e em outras precisa encaminhar notas fiscais para um setor competente antes ou depois do pagamento. Cada edital tem seu jeito de funcionar. Para você ter uma ideia, um edital do governo do estado que ganhei três vezes funcionou de uma forma diferente em cada uma dessas três vezes. Houveram mudanças BRUSCAS de um ano para o outro na forma de inscrição e de execução. Entender o funcionamento em cada uma das vezes me exigiu várias visitas à secretaria da cultura e muitas ligações telefônicas. E é MUITO IMPORTANTE fazer todos os procedimentos da forma correta, já que, no caso dos editais de entidades públicas, trata-se de dinheiro dos contribuintes. Você terá que prestar conta de cada centavo que gastar. E se fizer algo errado e não conseguir justificar adequadamente, corre o risco de ter que devolver TUDO com correção monetária.

E caso você não seja muito habilidoso com essa burocracia? Bom, pode ser que os editais não sejam o meio ideal para você financiar o seu projeto. Mas ainda há uma alternativa para o seu caso, que seria contratar alguém para fazer o projeto e lhe dar consultoria na sua execução. A maioria dos editais permite que um valor seja previsto para isso (mais uma vez: consulte o texto do edital que está participando).

Por último, editais não são boas opções para quem não gosta de prazos, já que geralmente você já entra no edital sabendo quando tem que terminar seu projeto. Quase sempre é possível negociar possíveis adiamentos, mas eles dependem de autorização da entidade que está financiando sua arte.

Vale lembrar que existem outras formas de se financiar produção de arte no Brasil (nos futuros textos espero falar mais sobre elas). E aí, pronto para correr atrás da grana vai ajudar a realizar o seu trabalho?



Gostou do texto? Você pode também deixar um comentário abaixo ou no meu Facebook, no post sobre ele.

Ah, é sempre bom lembrar que estou colocando tudo que leio nos meus perfis no Skoob (me sigam também no meu perfil de autor) e Goodreads e o que assisto está indo pro Filmow. Cliquem nos links e me adicionem por lá.

Já leu Quem Matou João Ninguém? ou Steampunk Ladies? Que tal ir no Goodreads e avaliá-los? Você ajuda a mais pessoas saberem se os livros são para elas:

 Bem rapidinho

  • Para quem é do Ceará, está abrindo amanhã o Edital de Incentivo às Artes do Governo do Estado do Ceará. É o bendito edital que financiou meus primeiros trabalhos. Não percam esta oportunidade. Mais informações aqui.
  • A esta altura você já deve estar sabendo que vai rolar a CCXP Tour, em Recife durante a semana santa, confere? Estarei lá, no Centro de Convenções de Pernambuco, de 13 a 16 de abril, dividindo mesa com o parceiro Nycolas Di. Já salvem na agenda.
 

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31 de out. de 2016

Grana X Criatividade (Lista do Zé #9)


Olá, olá!

Em homenagem ao Dias das Bruxas (ou Dia do Saci, você decide), o texto de hoje é sobre um assunto que aterroriza algumas pessoas: como ganhar dinheiro com arte e criatividade. É possível?

Lembrando que este e outros textos são enviados mensalmente para a minha lista de e-mails. Para receber na comodidade da sua caixa de entrada, cadastre-se ao final desta postagem.

Na semana passada fiz duas palestras e divulguei um podcast sobre Economia Criativa e pensei que isso poderia ser um tema legal para um texto.

Primeiro preciso dizer que a Economia Criativa salvou a minha vida. Antes eu era convidado para um evento/palestra/seminário/painel e não sabia bem se estava lá por que sou administrador por formação e analista técnico do Sebrae ou se por que sou roteirista de histórias em quadrinhos com alguma experiência em outras áreas de arte e cultura. Quando esse negócio surgiu, o primeiro benefício que recebi foi falar sobre as duas coisas ao mesmo tempo e isso fazer sentido... De forma bem resumida, falar sobre Economia Criativa é falar sobre a possibilidade de criatividade, arte e cultura gerarem alguma grana. Segunda a Ana Carla Fonseca, uma das maiores referências no assunto no mundo, “a economia criativa abrange todo o ambiente de negócios que existe em torno da indústria criativa, aquela baseada em bens e serviços criativos”.

Segundo o termo de referência do Sebrae, o conceito é bem amplo, indo desde museologia, passando por agências de design e editoras de literatura, até as startups, negócios inovadores com alto potencial de crescimento). Num texto muito bacana da Gisela Blanco, ela salienta que "tocar violão nas horas vagas ou fazer um filme com os amigos, apesar de atividades criativas, só vão fazer parte da economia criativa se alguém estiver lucrando diretamente com elas — ou pelo menos tentando". Vamos falar aqui sobre viver disso.

Deixando os conceitos acadêmicos de lado, a gente precisa começar pelo que é fazer arte, cultura ou qualquer outra atividade criativa no país: um exercício brutal de insistência. Isso por que 1) as pessoas não gostam de pagar por produtos culturais (ou tem isso como uma prioridade baixa na sua graninha mensal), 2) o brasileiro ainda vem se desvencilhando do preconceito da arte nacional (que vem lá da década de 50) e 3) uma série de outros problemas históricos, especialmente de educação. Como você já deve saber, eu amo consumir arte. Mas não acho fácil orientar alguém querendo empreender no meio. O jeito mais comum de se fazer arte no Brasil é conseguindo um emprego "convencional", o que garante uma certa segurança, enquanto no tempo livre você desenvolve a atividade artística. E eu tenho que dizer que isso pode ser um PÉSSIMO começo para um negócio nesse meio. Entendam bem, esse é o caminho que EU ESCOLHI. Mas desenvolver um empreendimento, seja em que segmento for, como hobby, na minha experiência, vem se mostrando um jeito muito lento de fazer um negócio dar certo. Isso quando dá certo.

Hobbies são coisas que gostamos de fazer. MASSA, você começou um negócio do jeito certo, fazendo algo que você gosta ou tem vocação. É uma das primeiras coisas que tento saber de uma pessoa que me conta que vai iniciar um negócio aqui no Sebrae. Mas hobbies são coisas que só se faz quando se sobra tempo pra fazer. E aí é que começa o problema. Negócios exigem dedicação, que se entre de cabeça no mundo deles. Um problema que tenho observado bastante com negócios que começam como hobbies é que eles não vão além disso. Acho bem válido que um negócio comece, sim, no tempo livre, até que o empreendedor entenda que ele é viável e que é o momento de imergir nele. Existe até uma expressão no meio das startups pra isso: leap of faith (que literalmente seria o "salto de fé", quando você arruma coragem para abandonar seu emprego "seguro" e se dedica a sua ideia inovadora). Mas é bom sempre se questionar se tendo um emprego em tempo integral você irá conseguir, só pra citar um exemplo, buscar novos serviços ou clientes.

Outra coisa a se pensar é transformar um hobby em trabalho. Um hobby é algo que se faz durante aquele período de ócio criativo, quando se quer esquecer a mecanicidade (acho que essa palavra nem existe, mas você entendeu) da vida real. Aí você decide oferecer aquele seu serviço de desenhista. Aparecem clientes. Aparecem prazos. Aparecem burocracias. E quando você menos se dá conta está achando tão chato desenhar quanto qualquer outro trabalho que já teve. E isso já aconteceu comigo em alguns serviços pagos de quadrinhos. Muito se fala sobre trabalhar com o que se gosta. Muita gente fantasia a respeito e cria grandes expectativas. A verdade é que se sujeitar a um mercado, seja do que for, vai implicar em responsabilidades. E, na boa, tem muita gente pensando que essa coisa de fazer arte ainda é coisa de boêmio, que só precisa se preocupar em criar. Mas tá difícil juntar boemia e grana hoje em dia, como recentemente discuti com o escritor Eneias Tavares no podcast Bestiário Criativo.

Tem ainda a questão "autoral x comercial". Eu sei que este papo de pensar arte comercialmente é um saco pra muita gente. Eu também acredito que a arte tem que ser livre de amarras e distante das esteiras industriais. Que se o artista quiser ele pode fazer aquilo só pra ele, sem se preocupar se alguém vai pagar por aquilo. Boa parte da arte de vanguarda surge assim. Pesquisa aí quando o Van Gogh começou a ganhar dinheiro com seus quadros e você vai descobrir que foi depois que ele morreu (por isso que eu choro quando assisto aquele episódio com ele do Doctor Who). Se seu objetivo é a arte pela arte, maravilha, este texto talvez não sirva pra você. E você não é um artista pior por isso (você é até uma figura necessária no meio). Agora se você quer ser músico aqui no Ceará o caminho mais indicado seria montar uma banda de forró. Mas o que fazer quando você quer tocar heavy metal? Ceder à pressão comercial para viver de música? A resposta vai estar em cada um. Quanto mais longe do comercial, mais tortuoso é o caminho, essa é a verdade. Mas não falo isso pra fazer ninguém desistir. O que ser mais autoral vai exigir do empreendedor criativo é mais planejamento. O que nos leva ao último ponto.

Mas por onde começar? Eu não faço distinção de um negócio de Economia Criativa de outro tradicional na hora de imaginar o início da atividade. No Sebrae indicamos duas ferramentas para abrir os horizontes: o Plano de Negócios e o Canvas.

O Plano de Negócios é uma coisa mais tradicional, indicada quando aquele empreendimento que você está começando é mais comum, ou seja, você está entrando num mercado conhecido (ou mais comercial, como é o caso da banda de forró já citada). É quando já existe bastante informação por aí sobre como ganhar dinheiro com sua atividade criativa. Você vai cair de cabeça neste mercado, entendendo tudinho dele primeiro, e jogar as informações neste documento. O Plano de Negócios é complexo e o Sebrae dispõe de algumas ferramentas para ajudar a fazer um (indico o curso online Iniciando um Pequeno Grande Negócio).

Já o Canvas é uma ferramenta indicada para negócios que são mais inovadores, ou que são menos comuns no mercado. Ele é bem mais simples de se usar, mas serve apenas para modelar o que você vai fazer, no sentido de ajudar você a enxergar melhor como vai ganhar dinheiro com aquilo (e outras nuances do negócio). O melhor lugar para aprender sobre o Canvas é o livro Business Model Generation - Inovação em Modelos de Negócios, dos autores Alexander Osterwalder e Yves Pigneur. O livro é tão bacana que podia muito bem ser uma das indicações que eu costumo dar aqui. Visualmente ele é lindo e o conteúdo, então, nem se fala. Ele mostra técnicas desde modelar o negócio até a hora de apresentá-lo para outras pessoas (incluindo um tal de storytelling, que eu ainda volto aqui pra falar um dia).

Enfim, o importante é começar e se planejar. Sempre li todos os manuais de roteiro e me preocupei com o FAZER da coisa. Não sei se por ser aluno do curso de Administração na época, mas quando comecei a fazer quadrinhos outra preocupação que tive foi entender o mercado para o autor nacional (mesmo ele sendo minúsculo na época). Participava de fóruns, acompanhava editores e formadores de opinião nas redes sociais, concorria em todas as coletâneas e premiações e ia para todos os eventos possíveis. Produzir é uma das coisas mais prazerosas (e importantes) do processo. Mas pra fazer parte desta brincadeira difícil que se tornou fazer arte no Brasil você precisa se informar.


Vale a pena mandar um ou outro texto sobre esse assunto? Me deixe saber que você gostou de ler esse texto através dos comentários.

Você pode também deixar um comentário sobre esse texto no meu Facebook, no post sobre ele.

Ah, é sempre bom lembrar que estou colocando tudo que leio nos meus perfis no Skoob (me sigam também no meu perfil de autor) e Goodreads e o que assisto está indo pro Filmow. Cliquem nos links e me adicionem por lá.

Por sinal, quer me ajudar? Se você já leu meus dois quadrinhos, que tal avaliá-los e ajudar outras pessoas a conhecê-los? É só entrar no Goodreads, Skoob ou Amazon (ou nos três) e escolher de 1 a 5 estrelinhas, de acordo com o quanto você gostou deles. Se já tiver escrito algo sobre eles por aí (às vezes para um site ou blog), copie o texto pra lá. Vou agradecer de coração.

Bem rapidinho
  • Anunciei na semana passada e foi um sucesso, aí entrei hoje na Amazon e vi que minha HQ Quem Matou João Ninguém? está novamente por APENAS 10 REAIS! Se ainda não tem, a chance é essa. Mas tem que ser rápido, por que o preço pode mudar sem aviso. Clique aqui para comprar o seu!
  • E seu interesse é Steampunk Ladies: Vingança a Vapor, também tem promoção. Comprando seu exemplar pelo site da Editora Draco você receberá gratuitamente um exemplar de O Peregrino, romance do Tibor Moricz que também mistura ficção científica com faroeste. Garanta seus livros comprando através deste link!
  • Como divulgado no início do texto, gravei um episódio do Bestiário Cast com o meu amigo Enéias Tavares, escritor do ótimo A lição de anatomia do temível Dr. Louison. Acho que o papo era pra ser uma entrevista comigo, mas virou um apanhado de percepções sobre o mercado de entretenimento no Brasil. Para quem se interessa sobre Economia Criativa, recomendo.
  • Saiu na semana passada um podcast Sem Fim (formato mais descompromissado do Iradex) com minha participação. Eu queria dizer qual é a pauta, mas a proposta é não ter pauta. Escute por sua conta e risco.

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